Cancioneiro Geral: Garcia de Resende e a vida palaciana
É às cortes de Castela e não aos trovadores portugueses da corte de D. Dinis, que temos de remontar para encontrar os antecedentes do Cancioneiro Geral, compilado por Garcia Resende, empreendido que se inspira no Cancioneiro Geral de Hernandez del Castillo, publicado em 1511. Resende compilou o que conseguiu recolher do material poético, em língua portuguesa e castelhana, produzido nas cortes de D. Afonso V, D, João II e D. Manuel.
Se costuma acompanhar o nosso blog é provável que já tenha encontrado um artigo dedicado a cancioneiros. Os cancioneiros eram, na Idade Média, compilações de cantigas de amor, de amigos e de escárnio e maldizer. Histórias em verso populares em determinados períodos históricos, compiladas num único documento.
Neste post, que faz parte de um especial do Mundo de Livros sobre a história da língua e literatura portuguesa, debruçamo-nos no de Garcia Resende, um documento marcante da literatura portuguesa. Este cancioneiro distingue-se dos anteriores por ter sido o primeiro a ser impresso em Portugal e por ter funcionado como o principal repositório de poesia portuguesa da época.
Cancioneiro Geral: a vida na Corte em forma de poesia
O Cancioneiro Geral permite-nos submergir na vida palaciana. À medida que se concentrava em torno do rei, a corte desenvolvia e variava a sua vida social, procurando formas próprias de passatempo e animação.
A grande maioria das composições do Cancioneiro Geral destinava-se aos serões do paço, onde se recitava, se disputavam concursos poéticos, se ouvia música, se galanteava, se jogava, se realizavam pequenos espectáculos de alegorias ou paródias. Tudo isto se fazia dentro de um estilo que tendia a apurar-se como se apurava o vestuário, o penteado, a linguagem e a etiqueta.
O ambiente cortesão explica o carácter lúdico, ligeiro e circunstancial de grande parte do conteúdo do Cancioneiro Geral, e ao mesmo tempo as formas estilizadas, espirituosas que nele por vezes se encontram.
As tradições trovadorescas do amor, enriquecida pelas aportações de Dante e Petrarca, são continuadas nos séculos XV e XVI. Alguns poetas acabam por chegar ao requinte de que o verdadeiro amor implica a renúncia à posse do ser amado, porque a consumação do desejo extinguí-lo-ia no amador.
Este formalismo do galanteio, aliado ao gosto do paradoxo conceituoso, enche centenas de páginas do ; mas encontra um correctivo escandaloso em alguns poemas satíricos, por vezes ostensivamente pornográficos, na continuidade da veia das cantigas de escárnio e maldizer.