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José Manuel Simões em Busca da Memória Eterna (Parte II)

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José Manuel Simões em Busca da Memória Eterna (Parte II)

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Nesta segunda parte da entrevista para o blog Mundo de Livros, o escritor José Manuel Simões desvenda as suas principais motivações para perpetuar as suas ideias através da escrita. E também revela as razões que levaram as nascimento das obras “Ponto de Luz” e “Deus Tupã”, onde mais uma vez o Brasil se assume como cenário para as aventuras do seu alter ego DuArte Camões.

(Se ainda não leu a primeira parte desta entrevista onde o autor português radicado em foca o olhar no seu primeiro livro, “Os Índios Potiguara”, por favor CLIQUE AQUI para ler agora).

Entrevista com José Manuel Simões (Parte II)

Gonçalo Sousa (Mundo de Livros) – Sentes que viajar é o teu destino? Ou escrever?

JMS: O meu destino é cumprir os traços que transporto na palma da minha mão.

GS: Partilhamos uma grande paixão e admiração pelo trabalho do Jack Kerouac. Consegues explicar porquê? E já agora, qual a influência dele no teu trabalho?

JMS: A Liberdade!

GS: Que outros autores consideras influentes não só na tua escrita, mas na tua vida?

JMS: São tantos e ainda mais que…

GS: Tens algum livro ou escritor preferido?

JMS: O nosso inconsciente tem armazenado os momentos que se revelam das formas mais inesperadas. O segredo é manter os bons e ignorar os que em nada nos acrescentam.

ponto-de-luz-jose-manuel-simoes-bannerGS: “Ponto de Luz” é um livro que estava guardado na gaveta, ou foi-se escrevendo ao longo de anos?

JMS: Acredito que “Ponto de Luz – Para além do Brasil Profundo” abre caminhos e rotas a explorar pela Literatura de Viagens. Visitando demorada e apaixonadamente o Brasil, todos os seus estados, 26 capitais de estado, Distrito Federal e lugares nele a descoberto, vai além da sua vasta geografia. Incute por Portugal, Suíça, Tailândia ou Estados Unidos da América, mas tem o seu epicentro numa viagem de 3 anos pelas terras de Vera Cruz, e penetra em profundidade no Rio de Janeiro, Salvador, Olinda, , Jericoacoara, Amazónia, Pantanal, Brasília e Foz de Iguaçu. A acção do livro passa-se, durante um ano, numa plataforma de petróleo. Aborda ainda questões como o existencialismo, a ética, a moral ou a religião, apelando à sua natureza interventiva e entra no âmago de artistas como Gilberto Gil, Djavan, Fafá de Belém, Caetano Veloso, Ney Matogrosso, Arnaldo Antunes ou Adriana Calcanhoto, ali revelados tangíveis através da relação que o personagem central da estória, DuArte Camões, encetou com o mundo da cultura.

Entre amores, desamores, aventuras e desventuras, DuArte – arte nativa, poesia visceral, amor à flor da pele e melancólicos vícios – guia-nos por surpreendentes atmosferas, vivências insólitas, relações intensas nem sempre bem-sucedidas, ambientes perigosos dignos de filme de ação, pressentindo deuses e espíritos, energias brotando de místicos pontos de luz. Escrito como se fosse ficção, acredito que este livro representa um passo além no conhecimento do Brasil profundo, das suas gentes e memórias. Via linguagem dinâmica, capaz de trazer o leitor para dentro da narrativa do primeiro ao último capítulo; afinal apenas um só.

Tudo começa com essa demorada viagem que percorre todo o Brasil no final dos anos 80 e um diário de bordo que me acompanhou durante todos estes anos. (Nota: essa mesma viagem está retratada no mapa exibido em baixo).

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GS: Qual a tua principal motivação para colocar em papel todas essas vivências narradas em “Ponto de Luz”?

JMS: Deixar a minha vida marcada de forma que os meus netos saibam quem foi o avô José Manuel Simões.

GS: Por que razão optaste por colocar a personagem principal com o nome DuArte Camões em vez de assumires que eras tu aquela mesma pessoa?

JMS: Porque o DuArte, com A maiúsculo, vai além de mim.

GS: Continuas a manter a amizade com muitos dos artistas que falas no livro “Ponto de Luz”?

JMS: O ano passado o Arnaldo Antunes esteve aqui em casa e foi um dos dias mais felizes dos meus quase 8 anos em Macau.

GS: A tua ligação ao Brasil é profunda e complexa. Consegues explicar porquê? O que te atrai tanto nas Terras de Vera Cruz?

JMS: As marcas dos meus antepassados. A minha bisavó materna era índia, os meus 4 avós viveram no Brasil, o meu pai nasceu em Santos. É arriscado dizer o que penso sentir, mas acho um quase pecado que o Brasil, depois dos 3 livros que escrevi sobre o país (o romance histórico “Deus Tupã” vai ser lançado este Verão em Macau e em Portugal) e dos dois filmes que fiz sobre os índios potiguara, das centenas de entrevistas e críticas de músicas que escrevi sobre artistas brasileiros, das reportagens e crónicas de viagem sobre dezenas de cidades brasileiras, teime em ignorar-me. Há quem acredite que ninguém descobre sem ser descoberto mas, por vezes, parece-me que há uma espécie de complexo de colonizado que faz com que o facto de eu ser português surja como um obstáculo ao eventual interesse do Brasil no trabalho que fiz sobre esse país que a esta distância não sei se ainda continuo a amar.

GS: “No mesmo escritor há dois: o que sofre uma situação, e o outro que olha para ela a pensar: como poderei aproveitar isto para o meu livro? Esta espécie de vampirismo impede um sofrimento maior.” Esta é uma citação do escritor português António Lobo Antunes a reflectir sobre o acto da escrita. Revês-te nela de alguma forma?

JMS: Admiro imenso a pessoa e a escrita do doutor António Lobo Antunes, mas para mim o ato de escrever está conectado com algo divino que não me parece que ele acredite.

GS: “Deus Tupã” (ainda por editar) é para mim uma completa surpresa. De que se trata?

JMS: O livro “Deus Tupã” é um romance histórico que cruza realidade e ficção e conta a História do ponto de vista do colonizador e do colonizado, dos portugueses e dos indígenas; de um lado e do outro o apelo à exclamação. Uns, porque eram invasores; outros, canibais. A desventura começa com a chegada de Mem de Sá ao Brasil em 1552; o seu amigo, bispo Sardinha, a ser assado e comido na praia, em frente aos navios de bandeira que ao largo avistaram a cena. D. João III, O Piedoso, que tinha herdado um império colossal de D. Manuel I e se preparava para deixar um país em ruínas ao seu neto, Sebastião, ainda O Desejado, herdeiro do trono quando tinha 3 anos, foi informado do ato de canibalismo dos indígenas e perdeu a cabeça.

Do outro lado, Sinã, cacique da tribo dos pitiguares, conhecido entre os seus pelo nome de “Luz Lilás”, mandou reunir na oca central onde lhe pintaram o rosto com traços firmes, a geometria dos signos direcionada a Tupã, protetor de gentes conscientes que a força dos arcos e das flechas iria revelar fragilidades perante o número de canhões acabados de aportar em Acajutibiró (terra de caju azedo) chamada pelos portugueses de Baía da Traição.

Quatrocentos e cinquenta anos mais tarde, DuArte, português de Coimbra, encontrou Itapuã e percebeu que algo tinha mexido nas suas entranhas; o destino à mercê do sangue. O jeito firme da índia, a forma resoluta e desinteressada como lhe falava, o ar respeitável, a sensação de “dejà vu”, atraiam-no profundamente. Para além do mais ela era lindíssima. Morena, olhar selvagem, cabelos como as ondas do mar, sentidos todos apurados. O português tinha mais 22 anos que ela e isso poderia ser um obstáculo; sobretudo porque ela “ainda era de menor”. Mas nada o dissuadiu. No dia do casamento, tribal, quando a pagé, a feiticeira, se abeirou de DuArte e de Itapuã, o inesperado aconteceu. Um índio desceu de um planeta efusivamente brilhante, admirando a todos por ser insólito; Deus Tupã brotando do céu em forma de alianças.

 

GS: Quando nasceu a ideia e quanto tempo demoraste a escrever tudo?

JMS: Escrevo compulsivamente, sem tempo nem limites.

GS: Em tempos falámos bastante sobre o teu projecto de escrever um livro sobre uma viagem que fizeste à Índia. Ainda existe esperança para esses escritos saírem cá para fora?

JMS: Acredito que sim. Chama-se “Em Busca de Shiva” e assim que terminar a tarefa que agora estou a levar a cabo – a escrita de “academic papers” e o meu projeto de pós doutoramento na Universidade Católica Portuguesa – irei retomá-lo, transformando a terrível viagem que fiz por esse país do qual guardo péssimas recordações num romance com improvável final feliz.

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GS: Como vês à distância o estado do jornalismo em Portugal?

JMS: Acredito que a imprensa sensacionalista tem os dias contados e que a solução passa por um jornalismo que, à falta de melhor nomenclatura, gosto de definir como “positivo”.

GS: Além de escritor, professor e jornalista, sempre conciliaste tudo com a fotografia. Ainda manténs viva a chama da fotografia dentro de ti?

JMS: Tenho andado a fazer umas incursões por uma fotografia picturalista que mantém viva essa paixão.

GS: A pose sempre mata a essência do individuo?

JMS: Segundo o Roland Barthes sim. Acredito porém que a fotografia perpetua os momentos, dando-lhes vida eterna.

GS: Sentes saudades de Portugal?

JMS: Tal como Fernando Pessoa tenho mais saudades do futuro que do passado.

GS: Tens previsto o regresso definitivo?

JMS: Gosto de projetar o futuro mas ainda não o consigo prever. Porém, feliz e infelizmente não faz parte dos meus projetos.

 

FINAL DA PARTE II

Esta é a segunda parte da entrevista com José Manuel Simões. Pode ler a primeira parte CLICANDO AQUI.

Os 2 livros já editados estão disponíveis nas seguintes lojas online:

“Os Índios Potiguara: Memória, Asilo e Poder” (2013) disponível na FNAC, Wook e Amazon.

“Ponto de Luz – Para além do Brasil Profundo” (2015) disponível na Livraria Cultura, FNAC, Wook e Amazon.

Aqui fica também o website oficial e redes sociais para quem deseja seguir os passos do José Manuel Simões:

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