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Pernaiada: A Substância da Vida (Review do Livro)

Pernaiada: A Substância da Vida (Review do Livro)

by Guido Bilharinho

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O gênero ficcional em cinema e em literatura (romance, conto, novela literária e peças teatrais) divide-se entre as obras de valor cultural e artístico e as de mero entretenimento e, algumas, até mesmo de auto-ajuda (para o autor).

O romance Pernaiada (2012), de José Humberto Silva Henriques, médico em Uberaba, com mais de 300 (trezentas) obras escritas em diversos gêneros, enquadra-se inteiramente no primeiro caso, como, também, toda sua vasta obra, disponível na Amazon.

A arquitetura da ficção estrutura-se a partir da estória, das personagens e da linguagem, sem as quais não se configura, conquanto a estória, como ação e série de atos, fatos e acontecimentos possa ser dispensada ou ao menos minimizada e restringida.

No caso, o Autor organiza seu romance em torno desses três fatores, em construção complexa, na qual os acontecimentos não são expostos em sua normal distensão cronológica, havendo, muitas vezes, inversões temporais que formam blocos ficcionais e vivenciais independentes dos atos articulados e dos acontecimentos expostos antes e depois deles, mas que, dialeticamente, inserem-se num fluxo temporal que não colide, não obstrui e nem transgride o eixo nodal da narrativa, que, ao contrário, com isso mais se adensa e se condensa.

A estória narrada nucleia-se sobre a substância da vida, no sentido de que não se perde nem se dissipa ou dilui em seriação de atos e fatos que extrapolem o sentido mais profundo da existência humana.

Em consequência, a ação romanesca essencializa-se e se concentra nos elementos fundamentais e indispensáveis que compõem o ser humano no exercício de viver, subsistir e se relacionar com seus semelhantes, com a natureza e com os animais que o cercam. Ou seja, o ser humano na sua integralidade e a vida humana nos seus contornos, marcos e conformações constituindo e formando a matéria romanesca.

Por isso, não desfilam na obra ações e atos das personagens que não sejam os determinados pelos componentes emocionais formadores de suas personalidades e pelos limites e condicionantes estabelecidos e impostos pela realidade.

A substância, a essência do ser e do viver humano em dadas época e espaço, perfaz sua matéria, disposta, conduzida e tratada com mestria, conformidade e conhecimento de causa e efeito.

Daí que as personagens – nesse contexto nem poderia ser diferente – são construídas de autêntica e veraz argamassa humana, de modo tal, que sua existência, atividade, reações, índole e maneira de exteriorização e relacionamento não extrapolam, não destoam nem divergem da arquitetura ficcional onde estão inseridas como traves de sustentação.

As personagens e a tessitura mental e relacional em que se envolvem e que tecem entre si compõem conjunto de vivências que se indiciam e se expõem por meio de finíssima e sutil teia existencial extraída da mais profunda e íntima consistência humana.

A configuração biotipológica, pertinência e autenticidade das personagens, suas atitudes e manifestações mentais e exteriorizadas refletem a verdade da natureza humana situada e vinculada espacial e temporalmente com tanta intensidade e propriedade que essas personagens transpõem a condição de criaturas de ficção para se erigir em protótipos de seres humanos.

Tubertino, o protagonista, e Quina, a serviçal da casa e que o ama, passam desde já, por sua condição de criaturas paradigmáticas, a compor a galeria das maiores personagens da ficção.

As demais personagens só não atingem igual nível e posição de importância na trama, porque a estória é centrada em Tubertino, o Pernaiada, e na inefável Quina. Mas, cada uma a seu modo e por sua atuação também alcança patamar inigualável.

Os animais, já que o enredo transcorre em fazenda do município de Jataí/ GO, assumem papéis de particular significado, sejam os cães Bola, Veludo e Sansão, seja o misterioso burro Cremoso.

Se a estrutura romanesca e a galeria das personagens assumem desde logo, ou seja, desde o momento crucial de sua criação artística, tal posição e significado, a linguagem com que se erguem, unem e se manifestam corresponde a igual e alto padrão concepcional e operacional, por apropriada, esmerada e requintadamente formulada.

Toda a argamassa ficcional, toda a substância humana das personagens só conseguem guindar ao elevado e primoroso grau de construção e refinamento que ostentam mediante a apurada e sensível verbalização que as plasmam e lhes dão vida.

O livro todo é da mesma perfeição elaborativa e de igual intensidade vivencial. Contudo, certas passagens conseguem se destacar ou pelo menos impressionar mais que o todo impressionante que é a obra.

A visita que Clarismundo faz a seu primo Vicente Nogueira para, pasme-se, reivindicar a mão do filho deste, Vicentinho, para casar-se com sua filha Genoveva, e que se estende pelos capítulos 19 e 20, destaca-se pelo brilhantismo do entrançamento e da tessitura dialogai, de inexcedível sutileza e adequação.

Por fim, ao final, mais um (grande) enigma construído na ficção brasileira, derivado de personagem complexa, mantida em nimbo etéreo de existência, Genoveva. Nesse caso, é quando Quina tira surpreendente conclusão entre uma constatação e um fato.

 

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