Primo Levi questiona se isto é um Homem
Primo Levi é autor e personagem de um livro autobiográfico, que abre a porta para um tempo onde ser judeu era crime, embora na altura questionasse porquê. A narrativa começa em 1943, termina em 1945. Auschwitz, que naquele tempo não era um museu, foi o espaço principal da história que, à luz dos dias de hoje, quase parece fictícia. Mas não foi.
Nascido na cidade italiana de Turim, Primo Levi formou-se em Química, todavia é pelas Letras que o mundo o recorda. Considerado como um dos principais autores do seu tempo, Levi deixou para a história um importante relato da realidade judaica no período nazi. é o título do livro onde descreve o período que viveu desde a captura até à libertação.
Tudo começou em 1943, altura em que foi preso por fazer parte da resistência contra o regime fascista de Mussolini. Através de uma escrita direta, onde emoções primárias são expostas, Levi fala da redução do Homem à qualidade de qualquer outra coisa, questionando-se a si próprio se aquilo que foi durante aquele período, era realmente um Homem (apesar de na altura não ter pensado muito nisso).
A objetividade rigorosa com que relata o dia-a-dia no Lager chega quase a assustar. Ao longo das páginas, o autor transpõe as preocupações de quem viveu e em Auschwitz e, curiosamente, estas não foram nem tão heroicas, nem tão revoltadas quanto aquelas que à primeira vista podemos imaginar. Pelo contrário, foram pensamentos primários que pouco iam além de comer, dormir e descansar mais um pouco.
Se Isto é um Homem: O dia-a-dia em Auschwitz
Da viagem de comboio, passando pelo processo aleatório de seleção de quem vivia ou morria, até aos dias de trabalho pesado. mostra a realidade num “Campo de Babel”, onde se cruzaram nacionalidades e línguas, e onde se estabeleceram dinâmicas próprias de uma espécie de sociedade onde o Homem não era algo que podia ser apelidado de tal.
Com descrições pormenorizadas e assustadoramente sóbrias, Levi fala, entre outras coisas, de como se criou uma espécie de mercado negro, onde pedaços de pão funcionavam como moeda de troca e onde se roubavam uniformes para mais tarde negociar uma porção de sopa. A enfermaria era uma espécie de lugar onde alguns desejavam ir para poderem descansar, embora não conviesse ter uma doença demasiado grave já que tal poderia ser sinónimo de “desaparecimento”.
A aceitação de uma realidade, o abandono dos sonhos e a inexistência de objetivos são um traço comum àqueles cujos pensamentos não iam muito além da próxima refeição ou de como proteger os poucos bens que lhe eram concedidos. É mesmo caso para dizer que o distanciamento leva faz parecer com que houvesse duas pessoas distintas: um Levi escritor e um Levi personagem.
Se Isto é um Homem: Uma obra intemporal
De leitura obrigatória, mostra a humanidade como ela é (ou foi), sem nunca a julgar. Embora esteja situada num período específico – o da II Guerra Mundial -, podemos dizer que a obra é intemporal já que é capaz de refletir o ser-humano no seu estado mais primário.
O livro levanta questões sobre aquilo que nos torna ou não humanos, levando-nos a refletir à medida que o processo de “desumanização” vai ocorrendo. E essa questão é, sem dúvida, intemporal.
Primo Levi suicidou-se no dia 11 de abril de 1987, sendo que o holocausto é uma das razões usadas para explicar a depressão de que sofria. Na altura, Elie Wiesel, Nobel da Paz de 1986, afirmou que “Primo Levi morreu em Auschwitz há 40 anos atrás”.